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Brasília,16/07/2025

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Francisco Salles

Anistia do 8 de Janeiro: Entre a Justiça e a Manipulação Política

Proposta de anistia revela disputas políticas e escancara estratégia de Bolsonaro para escapar de punição

Créditos: Agência Brasil
 Anistia do 8 de Janeiro: Entre a Justiça e a Manipulação Política Bolsonaro discursa de forma acalorada, cercado por aliados

Os eventos de 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores radicais do ex-presidente Jair Bolsonaro invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, marcaram um dos momentos mais graves da história democrática brasileira. Dois anos depois, o debate sobre a anistia aos envolvidos nesses atos golpistas continua a dividir opiniões, sendo frequentemente instrumentalizado por interesses políticos — especialmente pelo próprio Bolsonaro e seus aliados. Este artigo discute a proposta de anistia, separando os fatos da narrativa manipulada que tenta associá-la ao ex-presidente e à tentativa de golpe, ao mesmo tempo que analisa criticamente as responsabilidades e a aplicação da justiça.


O Contexto da Anistia e a Narrativa Bolsonarista

A proposta de anistia aos condenados pelos atos de 8 de janeiro ganhou força em 2025, impulsionada por manifestações convocadas por Bolsonaro, como os atos na Avenida Paulista e em Copacabana. No entanto, é importante destacar que, durante anos, nem Bolsonaro nem sua família demonstraram qualquer preocupação com os manifestantes presos. Apenas após o início das investigações e denúncias formais da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra ele — por crimes como tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito — é que Bolsonaro passou a defender publicamente a anistia. Essa súbita mudança de postura levanta questionamentos sobre suas verdadeiras intenções.

Bolsonaro, que já se referiu aos manifestantes como “malucos” e “pobres coitados” em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF), em junho de 2025, parece utilizar a bandeira da anistia como estratégia para proteger a si mesmo e seus aliados mais próximos — como os ex-ministros Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira — todos réus por envolvimento na trama golpista. O projeto de lei que tramita no Congresso, amplo o suficiente para potencialmente anular condenações relacionadas a atos anteriores ao 8 de janeiro, poderia, em tese, beneficiá-lo diretamente, como apontam juristas consultados pela BBC News Brasil.

A Arrecadação Milionária e a Ausência de Solidariedade

Um ponto que reforça a percepção de oportunismo é a falta de apoio concreto de Bolsonaro às famílias dos presos. Durante seu depoimento ao STF, o ex-presidente mencionou, orgulhosamente, ter arrecadado cerca de R$ 18 milhões por meio de campanhas, superando, segundo ele, até o Criança Esperança. No entanto, não há registros de que esses recursos tenham sido usados para ajudar os familiares dos condenados — como a esposa e os seis filhos do caminhoneiro Ferreira Luís, preso no Palácio do Planalto — ou outras senhoras detidas, algumas das quais foram alvo de desdém por parte de Bolsonaro. Em vez disso, parte desses valores teria sido destinada a sustentar seu filho, Eduardo Bolsonaro, nos Estados Unidos, onde ele tem denunciado supostos abusos do STF e do ministro Alexandre de Moraes.

Essa contradição evidencia que a defesa da anistia por Bolsonaro parece mais voltada para sua própria salvaguarda do que para a libertação dos manifestantes. Enquanto clama por “justiça e liberdade” em postagens nas redes sociais — como em 17 de junho de 2025, quando convocou um ato na Paulista —, a ausência de ações concretas para apoiar os presos reforça a ideia de que sua prioridade é evitar uma eventual prisão, que poderá ocorrer caso seja condenado a penas superiores a oito anos, conforme apontam especialistas.

A Justiça e a Necessidade de Proporcionalidade

O STF, sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes, condenou até dezembro de 2024 cerca de 310 pessoas por participação nos atos de 8 de janeiro, com penas que variam de 1 a 17 anos de prisão, por crimes como associação criminosa, tentativa de golpe de Estado e danos ao patrimônio público. Casos como o de Débora Rodrigues dos Santos, que pichou a frase “perdeu, mané” na estátua da Justiça e enfrentou uma proposta de pena de 14 anos, levantaram debates sobre a proporcionalidade das punições.

Embora os atos de depredação sejam inaceitáveis e representem um ataque à democracia, é válido questionar se penas tão severas para manifestantes que, em muitos casos, agiram sem articulação clara ou intenção golpista, são justas. O ministro Luiz Fux, por exemplo, já expressou preocupação com a dosimetria das penas, sugerindo revisão em casos específicos, como o da cabeleireira Débora. A PGR e o STF poderiam adotar uma abordagem mais flexível, reservando as punições mais rigorosas aos verdadeiros mentores e articuladores da tentativa de golpe, como Bolsonaro e seus aliados de alto escalão.

A Verdadeira Tentativa de Golpe e a Necessidade de Punição

As investigações da PGR e da Polícia Federal, endossadas pelo STF, revelaram que a tentativa de golpe foi planejada desde 2021, com Bolsonaro como figura central. A denúncia da PGR aponta que ele liderou uma organização criminosa que incluiu a elaboração da “minuta do golpe” e o plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa o assassinato do presidente Lula, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes. Documentos, depoimentos de militares como o general Freire Gomes e delações, como a de Mauro Cid, reforçam que Bolsonaro não apenas sabia do plano, como participou ativamente de sua formulação.

Diante disso, a anistia não pode ser um salvo-conduto para os responsáveis pela trama golpista. Enquanto manifestantes menos articulados, muitas vezes movidos por desinformação, merecem uma análise mais equilibrada de suas penas, os líderes da tentativa de ruptura democrática devem ser punidos com o rigor da lei. A proposta de anistia, se aprovada, não deve incluir Bolsonaro e seus comparsas, que, segundo a PGR, agiram de forma coordenada para subverter a ordem democrática.

Conclusão: Anistia para os Manifestantes, Não para os Golpistas

O debate sobre a anistia aos presos do 8 de janeiro é complexo e exige equilíbrio. Por um lado, muitos manifestantes, manipulados por desinformação e sem papel central na tentativa de golpe, merecem uma revisão de suas penas ou acordos de não persecução penal — como os 542 já firmados pelo STF. Por outro, a justiça deve ser implacável com os verdadeiros articuladores do ataque à democracia, como Bolsonaro e seus aliados próximos. A sociedade brasileira, conforme pesquisa Quaest de 2025, rejeita majoritariamente a violência do 8 de janeiro (86%) e apoia a punição de Bolsonaro (52% consideram justa sua condição de réu). Assim, a anistia deve ser um instrumento de pacificação social, contemplando os manifestantes que agiram sem intenção golpista — mas jamais os mentores intelectuais e operacionais do 8 de janeiro.

A democracia brasileira exige justiça proporcional, garantindo que os verdadeiros responsáveis pela tentativa de golpe respondam por seus atos — sem espaço para anistia a Bolsonaro e seu grupo.




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